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Mackinac Island, onde carros são proibidos

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Escuto quase todos os dias pelo menos algum tipo de manifestação contra a supremacia dos carros em nossas cidades. Os argumentos em geral são válidos – há locais onde a cultura do carro se tornou algo insustentável, representando mais um desafio do que um auxílio à mobilidade urbana. Isso sem falar de todos os outros subprodutos negativos desta cultura, como a poluição e o risco de acidentes graves. No entanto, não é meu papel discutir aqui a validade ou não do nosso modelo carrocêntrico – até porque eu uso carro no meu dia a dia e ia parecer hipócrita -, o meu argumento é que todas as vezes que ouço esta discussão, um lugar me surge na cabeça, Mackinac Island.

Marina de Mackinac Island. Fonte: WikiMedia/Notorious4life

Esta cidade representa, há mais de um século, a resistência dentro da boca do lobo. Localizada no estado de Michigan, a Mecca americana da produção de carros (foi lá que Ford criou o seu modelo T, e é lá a sede de grandes companhias como a GM, Chrysler, Pontiac, além da própria Ford), Mackinac Island decidiu muito cedo que não ia fazer parte desta cultura. Em 1898, os habitantes da ilha se reuniram e decidiram em conselho que realmente não gostavam daquelas máquinas que estavam se espalhando pela região. Entre outras coisas, a população reclamava que os carros eram muito barulhentos – assustando os cavalos de tração (carroças eram o principal meio de transporte no século XIX) – e a fumaça que saia deles causava doenças respiratórias entre os habitantes da cidade, à época um local conhecido de tratamento de tuberculosos. Assim, desafiando todo o resto do mundo, Mackinac Island nunca permitiu que veículos motorizados fossem usados dentro de seus 10km2 de limites administrativos, com a exceção razoável de algumas máquinas de emergência e de construção.

Bicicletas nas ruas de Mackinac Island. Fonte: WikiMedia/Gsgeorge

O que por muitas pessoas talvez possa ser considerado um obstáculo ao desenvolvimento, Mackinac Island usou para fazer exatamente o oposto. A proibição de carros e motos na ilha é hoje um grande chamariz para o turismo saudável, trazendo cerca de 15 mil visitantes por dia à região durante a alta temporada. Bicicletas são onipresentes nas ruas da cidade ou em volta do Mackinac Island State Park, uma reserva de proteção permanente dentro da ilha. E para aqueles que não tem condições de pedalar, bem… As carroças ainda estão lá.

Mas obviamente não é só com bicicletas e carroças que se faz uma cidade. Mackinac Island tem muitos outros méritos. Por exemplo, a cidade é o principal pólo de fabricação de fudge – uma espécie de rapadura de leite com chocolate muito popular em lugares frios – no norte dos Estados Unidos, e é um dos pontos de conexão entre dois dos maiores lagos do mundo, Huron e Michigan. Além disso, a cidade é bonita. A ausência de carros nas ruas da cidade te ajuda a notar a arquitetura colonial do lugar, semelhante à da nossa cidade de Gramado.

Taxi-carroça em Mackinac Island. Fonte: WikiMedia/J Dykstra

Se você estiver dando uma volta pelo centro dos Estados Unidos ou Canadá, é um lugar que vale dar uma passadinha para comer um fudge. A estutura hoteleira do lugar é muito boa, com diversas pousadas e pensões baratas, além do luxuoso Grand Hotel. Para chegar lá existem barcos saindo de cidades grandes como Chicago, Detroit ou Windsor, ou, durante o inverno e começo do outuno dá para alcançar a ilha usando um snowmobile, deslizando por cima do lago Huron congelado a partir do continente – mas cuidado, porque andar de bicicleta em um inverno de 10 graus negativos é muito punk.


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